quarta-feira, abril 11, 2007

Episódios

Coimbra, 23 de Março de 2007.

Sexta-feira de sol. Quente, como sempre são em Coimbra, por já ser uma cidade mais do 'enterior'. E talvez pela mesma razão se justifique o episódio que aqui relato.
Dirigi-me a Coimbra com a minha irmã para ir buscar o meu primo que chegava da Covilhã. O próximo comboio ainda tardava, pelo que fomos até à Martim de Freitas visitar a minha prima. Toca para a entrada e nós apanhamos o autocarro para voltar à estação. Calor e gente. Muita gente. E sacos de todo o tamanho e feitio a ocupar aquele espaço em frente à porta central que poderíamos ocupar, pelo que nos juntamos bem à beira da porta. Vou eu a recomendar o meu primo que se afaste quando a porta abrir para não correr riscos quando ela abre e verificamos que não acerta em nenhum de nós. Tanto melhor.
Mas o autocarro ia mesmo cheio. As pessoas que tentam sair, encolhem-se para passar por entre as que estão de pé e, numa das paragens, já com um pé fora outro ainda dentro, há uma senhora avantajada que lança um 'deixem passar..!' desdenhoso. ' É connosco? ' . Pois é. 'Eu até afastava, se tivesse para onde ir' - e reprimo o 'sua gorda' que estava mesmo a pedir para sair. Passou-se. Na paragem seguinte o autocarro apresentava-se tão ou mais cheio. Calor. Dor de cabeça. 'Farta de aqui estar, mas isto tem mesmo de parar em todas?'. Já só faltavam 4 ou 5 paragens, mas estava-se mesmo a ver que tinha de me chatear com alguma coisa. As pessoas começam a sair, comprimimo-nos ao vidro que nos separa dos lugares sentados, mas há um senhor simpático que do alto dos seus 70 anos e do fundo do umbigo em que já nem consegue pôr os olhos diz, curiosamente também já quase com um pé de fora e, coincidência das coincidências, com igual ou maior desdém 'vão lá p'ra marmelada para outro sítio!'. (...). 'Quê, mas era para nós, Gonçalo?' . Ele ri. 'Marmelada? Eu dizia-lhe já que não sou afincadamente apologista de meios encestos...' - digo para o chão, entre-dentes. A coisa estava montada. Começo a ouvir uns comentários de umas senhoras de 50 anos para cima, para não destoar, bem constituídas, que já tinham o caso como novela mexicana. 'Deixe-os la', home', que estão na idade!'. Fecha-se a porta. Dou a coisa por terminada, de olhos cerrados, tal era a paciência. 'Não liguem, filhos, tomara eu ter feito o mesmo! Tomara eu ter a vossa idade!'. 'Mas o que é que eu tenho a ver com isso?' - digo para o meu primo. Ele ri. 'Era o que me faltava agora!Que paciência...!Oh, gentinha...é por isso é que este país me...oh, que gente!'. E ele ria. E eu ria também...de nervoso. E ela tinha apoiantes que diziam 'sim, sim...' e ela ainda dizia 'ora essa..!'.
Mas quê, eu vou a falar com um rapaz de olhos postos no chão para não ter de olhar para a gente que me rodeia, comprimida contra um vidro, e há alguém que vê 'marmelada' nisto? Pois se fosse fruta, esmagada já estava..(!) mas sendo gente...
É que apontam o dedo ainda mais depressa que a gentinha adolescente...!

Mas eu gosto...destas viagens ao 'Portugal profundo'.


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PS: E eu só não me enervei mais porque pensava 'esta vai já para o blog...'